Por Bruna Wladyka
Todos os dias nos deparamos com falas e expressões racistas. A escravidão acabou, mas os sinais dela ainda permacem. Talvez você nunca tenha reparado, mas nós temos em nossos vocabulários palavras e expressões que ainda hoje são consideradas “normais” sem nos darmos conta da conotação racista que carregam. Entendo que quando falamos algumas dessas, não temos a intenção de maldade ou preconceito. Pelo contrário, muitas saem de forma inocente, porque crescemos escutando, como se fosse parte da retórica popular. Mas, também crescemos em uma estrutura racista, achando tudo normal.
Acontece que estamos em 2020 e o que mais queremos é ver a mudança acontecendo: educar, informar, transformar. A atitude e a vontade da mudança, precisa partir de cada uma de nós. Só assim sentiremos a mudança que queremos no mundo.
Esse texto é uma forma de nos conscientizar sobre alguns erros que cometemos ao falar. E, também uma forma de você conseguir reeducar as pessoas ao seu redor, que possuem, de uma forma ou outra, em suas falas e conversas perpetuam o preconceito e a opressão.
Acredite, esse tipo de discurso está enraizado em muitos lugares e momentos que parecem “simples”, como uma conversa entre amigas, com sua família, ou até em uma reunião formal de trabalho. Recentemente, eu passei por isso. E foi quando me dei conta:
ual estamos em constante aprendizado e mudança. Precisamos aceitar isso para nos tornarmos seres humanos melhores.
Tendo como base minha própria experiência, fui atrás de descobrir mais sobre o real significado de muitas falas e expressões da retórica no Brasil. Listei algumas e te convido ler, parar, refletir e, então, excluí-las de vez do seu vocabulário.
Lembre-se, toda mudança é um processo, que nem sempre é fácil. Eu mesma estou nesse processo e ainda me pego falando errado. Mas, ao mesmo tempo, vou me corrigindo e me policiando. Estou ciente, e esse é um ótimo começo para a mudança. Basta querer.
“Inveja Branca”
Quando usamos essa expressão, a intenção é de passar a ideia de algo positivo, sem malícia ou maldade. Porém automaticamente estamos associando o preto como comportamento negativo e ruim. Inveja é inveja, e sempre será um sentimento ruim. Mude isso!
“Lápis cor de pele”
Não, essa cor não existe, nem nunca existiu. Não existe UM tom, UMA cor de pele, ainda mais ele sendo rosado ou bege. Cor deve ser chamada pelo nome da cor: rosa, bege, amarelo, verde, marrom, preto, branco, cinza, azul. Falar em tom de pele já é outra história.
“Meia tigela”
Quando os pretos que trabalhavam em minas não alcançavam suas “metas” eles recebiam apenas meia tigela de comida e ganhavam esse apelido para mostrar que não tinham valor algum.
“Mulata”
Usado para falar de mulheres pretas como mercadoria, o termo tem uma carga ainda mais pejorativa quando se diz “mulata tipo exportação”.
“Cor do Pecado”
Por muito tempo me soou como elogio, remetendo a sensualidade. Mas a ideia de pecado é ainda mais negativa numa sociedade pautada em religião, como no Brasil. Além disso, remete a cor de pele da mulher.
“Samba do crioulo doido”
Uma expressão que significa confusão, que reafirma a discriminação. Foi título de um samba que ironizava a História do Brasil contada nas escolas, passando a ideia de bagunça, sem ordem.
“Não sou tuas negas”
Ai ai, expressão popular essa hein! E que, assim como as outras, deve ser cortada imediatamente. Coloca a mulher negra como qualquer uma, de todo mundo. As escravas eram, literalmente, propriedades dos homens brancos. Além de trabalhos duros eram submetidas a satisfação de desejos sexuais. Isso em um tempo que as mulheres eram estupradas, agredidas, assediadas com frequência e carregavam toda essa dor calada. Além de racista, carrega um machismo sem igual.
“Denegrir”
Em seu significado “tornar negro” mas seus sinônimos são difamar, desonrar, caluniar, rebaixar.. Entendeu o problema né?!
“A coisa tá preta”
Usada para falar que algo tá ruim, difícil, desagradável, perigoso. Outra expressão racista que não precisamos de muita justificação para exterminar.
“Serviço de preto”
Sempre levando para algo ruim, que não está bom. Na mesma linha dessa expressão ainda estão: “Mercado Negro” ”Magia Negra” ”Ovelha Negra” “Lista Negra”
“Criado Mudo”
Você sabia que esse móvel que é comum ao lado da cama, vem da época da escravidão? Os escravos ficavam nesse mesmo lugar segurando objetos para os “seus senhores” sem poder fazer barulho. Cruel! Mas aconteceu. Portanto, vamos parar de falar isso e a partir de agora usar: mesa de cabeceira ok?!
“Feito nas coxas”
Você sabia que os escravos moldavam telhas (de telhado mesmo) feitas de argila nas coxas, literalmente nas coxas. E como cada um tinha um porte físico diferente, as telhas ficavam desiguais, deixando os telhados irregulares. E ai vem a expressão para um serviço mal feito. Mais uma vez associando o ruim ao preto.
E aí? Bora reeducar nosso vocabulário?
Se você conhece alguma palavra ou expressão racista que não esteja neste texto, por favor manda pra gente. Já deu de achar que elas são “normais” e que podem continuar circulando por aí sem problema. Lutamos pela igualdade racial e uma forma disso acontecer está na mudança de hábitos preconceituosos, inclusive em nossa fala cotidiana.
Lembre-se: não existe discurso antirracista se não começarmos por nosso vocabulário.
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