Texto e fotos por Cath Pescinelli
No último sábado, 31 de outubro, parti do Litoral Norte em direção a Sorocaba/SP. Duzentos e oitenta quilômetros depois, cheguei à cidade que também é sede do Lucky Friends Rodeo — evento anual de cultura custom que representa a cena brasileira com legitimidade caipira, fazendo bonito frente a eventos internacionais do mesmo porte. Deixei minhas malas no hotel e fui direto para a pista. A partir daqui conto o que vi e explico melhor sobre esse tipo de evento, que é novidade pra muita gente. Vem comigo!
História: Flat Track ou Pistal Oval
A competição profissional em pista oval de terra — Flat Track — tem seus primeiros registros no início do século XX nos EUA, porém não é exagero dizer que, mesmo antes, onde houvesse uma motocicleta e um pedaço de terra plano em uma fazenda, lá estaria um circuito oval. Apesar disso, a Grande Depressão Americana e a Segunda Guerra Mundial desaceleraram a evolução do esporte até os anos 1960, quando a contracultura e o motociclismo explodiram e criaram as referências que conhecemos até hoje. Nesse momento, além das precursoras americanas Indian Motorcycle e Harley-Davidson, entraram em cena montadoras de outros países, como a britânica Triumph e a japonesa Yamaha. Pelo movimento do mercado, o esporte ia tomando corpo. Depois de muitos altos e baixos ao longo das décadas vemos hoje o Flat Track mais uma vez ganhando a notoriedade que merece.
Com seu jeito de antigamente misturado à habilidade profissional de seus competidores, o esporte é garantia de divertimento ao espectador, que fica com o coração na mão a cada volta — como eu fiquei.
On Track:
Expectativa e Preparação
Nas 24 horas anteriores à primeira bandeirada, a energia dos bastidores era agitada, barulhenta: teste e ajustes de motores, correria generalizada, gritos de comando entre membros das equipes e risadas. Era o momento de ter as máquinas prontas, com sorte. Além de categorias mais tradicionais como a Sportster, o evento contaria com corridas de minimoto à fantasia e motos antigas — algumas delas com mais de 70 anos de vida, como é o caso da Flathead 1946 com câmbio suicida (embreagem no pé e marcha na mão) que seria pilotada no dia seguinte por Edna do Prado. Edna estava acompanhada pelo irmão e pela mãe, que me mostrou uma foto onde ela pilota a mesma moto anos atrás, cabelos aos ventos. Já era final de tarde, e estávamos todas ansiosas para o dia seguinte.
Chegou a hora
Era o meu segundo dia no campo de provas, o Lucky Friends Arena. Hoje a energia era completamente diferente: a concentração dos pilotos era contagiante e trazia sensação de paz. Alguns, deitados no gramado, já estavam cobertos de poeira vermelha dos treinos; outros se vestiam calmamente. Bruna Wladyka, piloto da categoria FT411, correria com os homens. As categorias não possuem divisão por gênero e Bruna vem treinando há meses.
Está pronta.
Agora sim, motos na área de concentração, e a largada está próxima. Depois disso a emoção tomou conta pelas quase 5 horas de evento que se seguiram. Bruna, primeira piloto brasileira de Flat Track, estava com garra e vontade, e em uma das curvas, ao buscar ultrapassagem em cima de Seku Mello, os pneus se tocaram e Bruna caiu. Já fora da pista e sem lesões, as lágrimas eram de frustração por não ter conseguido terminar a prova.
“Eu estava pronta, passei por uma preparação e mudança grande na minha vida. Infelizmente, em uma competição tudo pode acontecer, e ao tentar ultrapassar uma moto na última volta tive uma queda. A queda foi para mim um mergulho definitivo no Flat Track. Comecei e não largo mais, que venha muito treino e preparação pela frente”, conta Bruna.
Edna Monteiro e sua Flathead ’46 também não terminaram. Ao conversar com ambas percebi que, mais que frustração, ficou a sede de continuar no esporte.
Além das categorias mais tradicionais, o On Track contou com uma corrida maluca de minimotos com os pilotos fantasiados. A inclusão dessa categoria reforça o conceito de entretenimento do evento, e nos dá a lição de que além da competição, a diversão é um componente muito importante. Gisele Favaro, produtora de conteúdo e empresária, tem a personalidade perfeita para a corrida maluca, e lá estava ela:
“O On Track veio pra ficar! Um evento ousado e inovador que tirou todo mundo da zona de conforto para trazer diversão em tempos estranhos. Foi um prazer participar desse novo conceito de evento e uma honra representar a mulherada na corrida de minimotos, que é uma atração danada de divertida. De tão bacana que foi, já penso em competir em alguma categoria oficial na Flat Track de 2021”.
Sabe que até eu fiquei tentada?
Lições e o Futuro
Bruna Wladyka — que além de piloto é cofundadora do BMS — me contou um pouco mais sobre a concepção do evento nesse momento delicado em que vivemos e a importância da corrida para a cena nacional.
“Quanto ao evento, foi [algo] único. Além de conseguir fazer algo assim no meio de uma pandemia, com certeza o dever e a promessa de fazer a galera sentir a poeira em casa foi cumprida”, diz orgulhosa. “O On track deu um salto para o crescimento do Flat Track no Brasil, e sem dúvida vem muita coisa boa para o próximo ano, colocando a modalidade no Brasil na rota mundial das competições”.
Na sua primeira edição e em um ano difícil, o evento já se provou um importante cenário de fomento ao investimento em esportes e entretenimento por grandes marcas, além de atrair alguns dos nomes mais relevantes do custom, Flat Track e atletas profissionais — nacionais e internacionais. Aqui fica meu agradecimento a todos os envolvidos e meu desejo de vida longa ao On Track e ao Flat Track no Brasil. ✌️
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